Priberam | Comentários

Priberam » Palavra do dia

22 dezembro 2010

Solidão

Solidão

Aproximo-me da noite
o silêncio abre os seus panos escuros
e as coisas escorrem
por óleo frio e espesso

Esta deveria ser a hora
em que me recolheria
como um poente
no bater do teu peito
mas a solidão
entra pelos meus vidros
e nas suas enlutadas mãos
solto o meu delírio

É então que surges
com teus passos de menina
os teus sonhos arrumados
como duas tranças nas tuas costas


guiando-me por corredores infinitos
e regressando aos espelhos
onde a vida te encarou

Mas os ruídos da noite
trazem a sua esponja silenciosa
e sem luz e sem tinta
o meu sonho resigna

Longe
os homens afundam-se
com o caju que fermenta
e a onda da madrugada
demora-se de encontro
às rochas do tempo

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"


3 comentários:

Lobo das Estepes disse...

gosto muito de mia couto, tanto na poesia como na prosa.

Pinky disse...

Nunca li nada dele, mas gostava...que recomendas?

Kiss kiss

Lobo das Estepes disse...

já não faço ideia de quais os livros dele que folheei... só sei que gostei de todos. escolhe um qualquer! lembro-me de um verão, em que escrevi uma micro-poema com base num dele, e usei duas frazes dele para introduzir e concluir uma prosa poética minha, desse mesmo verão... bons tempos.

muah muah